E os torna imortais!
“Nada na vida deve ser temido, apenas compreendido.”
Marie Curie
Marie Curie morreu aos 66 anos vítima de anemia aplástica causada pela exposição prolongada à radiação. Durante décadas, andou com tubos de rádio no bolso porque “brilhavam lindamente no escuro” e trabalhou sem proteção com materiais que hoje sabemos serem letais.
Esta é a história paradoxal de quem desvendou os segredos da radiação atómica, sem suspeitar que essa descoberta a destruía silenciosamente.
DA POLÓNIA PARA A CIÊNCIA
Maria Skłodowska tinha 24 anos e 40 rublos no bolso quando chegou a Paris. Na Polónia, ser mulher e inteligente era quase crime duplo. Na Sorbonne, era frequentemente a única mulher entre 100 estudantes, mas a determinação compensou: licenciou-se em Física (1893) e em Matemática (1894).
O encontro com Pierre Curie, em 1894, mudou tudo. Casaram no ano seguinte: ela de vestido azul-escuro, prático para não mostrar nódoas do laboratório. Passaram a lua de mel a passear de bicicleta e a discutir Física pelo caminho!
O MISTÉRIO QUE BRILHAVA NO ESCURO
Em 1896, Henri Becquerel descobriu acidentalmente que os sais de urânio impressionavam chapas fotográficas no escuro. Ninguém compreendia o fenómeno, mas Marie arriscou estudá-lo no seu doutoramento.
Descobriu que a radiação emitida pelas suas amostras era proporcional à quantidade de urânio, independentemente da forma química. Isto significava que era propriedade dos átomos!
Testou todos os elementos conhecidos e descobriu que o tório também era radioativo. Mais intrigante: encontrou minérios mais radioativos do que o urânio puro. Conclusão: continham elementos desconhecidos.
A CAÇA AOS ELEMENTOS FANTASMA
Pierre abandonou a sua investigação para se juntar à caça com Marie. Numa barraca abandonada, processaram toneladas de material em caldeirões enormes, mexendo com uma vara de ferro, num trabalho que mais parecia alquimia medieval.
Em 1902, isolaram um décimo de grama de rádio puro — metal que brilhava no escuro com luz azul-esverdeada hipnotizante. Pierre ficou tão fascinado que carregava amostras no bolso, desenvolvendo queimaduras que demoravam meses a cicatrizar. Em vez de alarme, isto gerou entusiasmo: uma substância que queimava sem fogo!
GLÓRIA E TRAGÉDIA
Em 1903, Marie, Pierre e Becquerel receberam o Nobel da Física. Quiseram exclui-la, mas perante a insistência de Pierre, Marie tornou-se a primeira mulher laureada!
A tragédia aconteceu em 1906. Pierre saiu do laboratório com dores de cabeça terríveis (sintoma da radiação) e, distraído, atravessou uma rua sem olhar. Uma carruagem não parou a tempo…
A Universidade ofereceu-lhe uma pensão de viúva e sugeriu-lhe que se “retirasse da ciência.” Mas Marie insistiu em substituir o marido nas suas aulas, tornando-se a primeira mulher professora na Sorbonne. Trabalhava 16 horas por dia e levava as filhas para o laboratório, que brincavam com os tubos radioativos…
Em 1911, Marie recebeu o segundo Nobel, em Química, tornando-se a primeira pessoa a ganhar este prémio em duas áreas distintas!
Na Primeira Guerra, Marie desenvolveu unidades móveis de raios-X, os “petites Curies”, que levava às trincheiras, ajudando os médicos a localizar estilhaços nos feridos. Salvou milhares de vidas com o uso da radiação, sem saber que a mesma radiação a matava.
O PREÇO DA DESCOBERTA
Nos anos 1920, a saúde de Marie deteriorou-se, mas ninguém percebeu a relação da doença com a exposição à radiação. Um jovem investigador ficou horrorizado ao vê-la manusear rádio sem luvas. Quando sugeriu precauções, Marie riu: “A radioatividade nunca fez mal a ninguém!”. Morreu dois anos depois.
Não deixa de ser irónico e extremamente cruel: Marie Curie conquistou a imortalidade através da descoberta que lhe custou a vida!
Hoje, 90 anos depois, os seus objetos pessoais permanecem radioativos, mas a Ciência evoluiu: os seus cadernos estão em caixas de chumbo e consultá-los exige o uso de equipamento de proteção.
No fundo, Marie Curie tinha razão: “Nada na vida deve ser temido, apenas compreendido”.
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